terça-feira, 19 de outubro de 2010

Out of Sight

lindo, lindo. ganhei de presente hoje pra salvar meu dia.

domingo, 17 de outubro de 2010

o samba e o vento



E o propósito disso tudo? Perguntei.

Sem pedir licença (cerimônia é perder tempo, dizia), o olhar dele percorreu os objetos coloridos na estante. Levantou, acendou um cigarro e parou em frente à vista calma da janela lá de casa. Ele, que sempre me ensinou a ter calma, parecia inquieto.

A dúvida basta pra mim. Disse ele. Esse misto de desconforto e liberdade é o que eu sei viver. O incômodo talvez seja mesmo a única prova de que a gente existe, no aqui, no agora.

Vamos almoçar? E me deu aquele sorriso de menino.

Entendi que não era a fome ou as minhas perguntas que o aborreciam, mas o fato de eu querer, sempre, todas as respostas.

Antes de sair, ligou o som e me deixou de presente o disco novo de uma amiga do Rio que já não via há tempos.

E ali ficaram: o samba, o vento, e eu.


Ele, que tanto sabe das coisas, preferiu o mar.


Foto: arquivo pessoal

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Conversa de bêbado


Pois já era hora. Urgência eu tinha. Pressa mesmo. As explicações, entretanto, – todas inúteis, preciso destacar – multiplicavam-se como fungo. E não é por falta de conhecimento não. Sei, há anos, que o que é simplesmente é. Por algum motivo, contudo, a necessidade de me justificar toma conta dos poros, sob os olhos exigentes e curiosos dos poucos companheiros de bar. Uma cerveja aqui, outra ali, uma perguntinha aqui, outra ali, e as palavras a flutuar. Rima barata, clichês, porquês e mais um copo. E nada do que expresso e conto é o que eu penso ou sinto. Conversa de bêbado, pois.


E estava aqui a saracotear poetas, quando encontrei quem há de me salvar dessa ressaca da lógica:


“Não sei se a vida é pouco ou demais para mim.
Não sei se sinto de mais ou de menos, não sei
Se me falta escrúpulo espiritual, ponto-de-apoio na inteligência,
Consanguinidade com o mistério das coisas, choque
Aos contatos, sangue sob golpes, estremeção aos ruídos,
Ou se há outra significação para isto mais cômoda e feliz.

Seja o que for, era melhor não ter nascido,
Porque, de tão interessante que é a todos os momentos,
A vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger,
A dar vontade de dar gritos, de dar pulos, de ficar no chão, de sair
Para fora de todas as casas, de todas as lógicas e de todas as sacadas,
E ir ser selvagem para a morte entre árvores e esquecimentos,
Entre tombos, e perigos e ausência de amanhãs,
E tudo isto devia ser qualquer outra coisa mais parecida com o que eu penso,
Com o que eu penso ou sinto, que eu nem sei qual é, ó vida”.


Álvaro de Campos

Foto: arquivo pessoal. (numa barraca de lona, essa senhora vive há anos em frente à Casa Branca, em Washington. sua vida é um protesto contra a indústria armamentista).